Espiritualidade vestida de gente

criança

Aprender a vestir a minha espiritualidade com humanidade, simplicidade, humildade, sensibilidade e compaixão é um desafio diário.

A verdade é que ou nós somos tentados a viver uma humanidade sem espiritualidade ou uma espiritualidade sem humanidade. Mas por mais “espiritual” que alguém pense ter se tornado, ele é um ser humano como qualquer outro ser humano, com todas as dificuldades, necessidades, fraquezas, perplexidades, limitações, tentações, ambiguidades, contradições, dúvidas, falhas, medos e conflitos que todos experimentam.

Tentar negar isto e fazer “de conta” que não é assim é caminho certo para um profundo adoecimento interior e para não viver o verdadeiro Evangelho de Jesus. É o caminho de uma religiosidade doente, mas nunca do Evangelho.

Porque por toda a Bíblia eu posso ver a humanidade de seus personagens sendo exposta sem disfarces.

Eu leio, por exemplo, que Elias, um conhecido personagem bíblico, era homem semelhante a nós, sujeito aos mesmos sentimentos, e orou, insistentemente, a Deus para que não chovesse sobre a terra, e, durante três anos e meio, não choveu. O texto continua dizendo que ele orou de novo e o céu deu chuva e a terra fez germinar seus frutos.

Elias era homem sujeito às mesmas dores, imperfeições, crises, contradições, tentações, doenças e sentimentos; mas, nem por isto deixou de ser de Deus. Ele era homem e nem por isto deixou de ser ouvido, quando teve a coragem de orar e crer que Deus era capaz de ouvir a voz de um simples homem como ele.

A verdade é que a Bíblia toda é a história do relacionamento de Deus com homens e mulheres exatamente como você e eu. E o que é interessante é que ela jamais esconde a humanidade mais visceral de seus personagens.

Ou seja, na Bíblia não há superhomens ou supermulheres da fé; apenas homens e mulheres comuns, de carne e sangue, que através de sua confiança simples e sincera em Deus caminharam com Ele na terra dos homens.

Se você conhece a história de Elias, por exemplo, sabe que ele foi aquele profeta que orou e o fogo desceu do céu; orou e o céu se fechou; orou de novo e a chuva veio torrencial e abundante sobre a terra seca.

Só que este mesmo profeta, porque era um homem como qualquer um de nós, sentou-se debaixo de uma planta do deserto e pediu a morte para si. Este mesmo homem de fé em Deus entrou em uma caverna e se encolheu em seu medo, tristeza, frustração e profunda depressão.

Pense que Deus não escolheu usar seres glorificados e perfeitos para expressar Sua vida, graça e amor; Ele decidiu usar gente como você e eu. Gente que chora e que ri; que duvida, mas que volta a acreditar; que cai, mas que se levanta; que passa por crises, mas que as enfrenta pela graça de Deus.

Eu jamais posso me esquecer de que Deus se fez gente e habitou entre nós. Ou, nas palavras de João: “O Verbo se fez carne”.

Jesus é o Deus que nasceu como um pequenino neném; foi enrolado em faixas e panos e deitado numa manjedoura em uma pobre e simples estrebaria. Ele é o Deus que se deixou ser cuidado, amamentado e carregado no colo de uma mulher. Ele é o Deus que precisou aprender a andar, a comer, a falar e a fazer todas as outras coisas do mesmo modo que você e eu precisamos. Ele é o Deus que cresceu como menino e aprendeu o ofício de carpinteiro.

Eu nunca me esqueci de um pregador que disse certa vez que Jesus não tinha rosto de anjo, mas rosto de homem.

É aí que em Jesus, Deus se fez homem e se misturou no meio das pessoas. Ele habitou entre nós, andou neste chão, viveu como gente, enfrentou as realidades e as dificuldades da vida que todos nós enfrentamos, chorou as lágrimas da existência que todos nós choramos, sentiu e sofreu as dores e as angústias que todos nós sentimos e sofremos.

E é por isto que Ele pode se compadecer de nós e nos socorrer no momento que necessitamos.

Jesus realmente sabe o que é ser gente. Ele, sendo Deus, se limitou a Si mesmo, se empobreceu a Si mesmo, se humilhou a Si mesmo e se fez Homem de dores e Servo sofredor que sabe o que é padecer. É isto que a Bíblia nos ensina.

Mais que isto, Jesus é Deus que nos amou e se entregou por nós no alto de uma cruz. Deus estava em Cristo, diz a Bíblia, reconciliando consigo mesmo o mundo.

Na cruz, Ele morreu a sua e a minha morte, carregou sobre Si mesmo os seus e os meus pecados, levou a nossa culpa, recebeu o juízo que era para nós, pagou a nossa dívida, nos perdoou, riscou o escrito de dívida que nos era contrário e o encravou na cruz e é perfeitamente capaz de nos salvar e levar de volta à comunhão com o Pai Celestial. O que eu preciso fazer é sinceramente me voltar para Ele e crer nele e no que Ele fez na cruz em meu lugar.

Eu me lembro, quando Pedro escreve que os mesmos sofrimentos que nós passamos também acontecem entre nossos irmãos por todo o mundo. E isto me mostra o quanto há uma espécie de democratização do sofrimento neste mundo, porque todos sofrem de um jeito ou de outro.

É aí que eu nunca estou isolado na minha dor. Eu não sou o primeiro, não sou o único e não serei o último a sofrer desta dor. Há, agora mesmo, uma multidão imensa de companheiros de tribulação atravessando os mesmos dramas que eu enfrento. Mas não só isto: há uma nuvem enorme de testemunhas ao redor testificando que, com a graça de Deus, é possível passar por isto sem ser destruído pela dor que eu estou sentindo.

O que eu preciso fazer é resistir, firme na fé em Jesus que me amou e a Si mesmo se entregou por mim. Eu preciso resistir, sabendo em quem eu tenho crido e que Ele é poderoso para guardar o meu depósito até o dia final. E isto não é confissão positiva ou “fé na fé”, mas, simplesmente a confiança simples e humilde em um Deus que me ama além de todo o entendimento e que disse que nunca irá me deixar e que jamais irá me abandonar.

A Palavra de Deus afirma que nós somos amados, queridos e guardados em Deus. Na verdade, ela vai além e diz que a sua e a minha vida estão escondidas com Cristo em Deus e que nada e ninguém podem nos arrebatar de Suas mãos ou nos separar no Seu amor.

É então que eu aprendo que se eu vou viver uma verdadeira espiritualidade, eu preciso vesti-la com cara de gente.

Eu preciso colocar de lado todos os cacoetes, chavões, frases de efeito, maneirismos e adoecimentos da religião e começar a expressar a vida de Jesus com humildade, liberdade, honestidade, simplicidade, modéstia, singeleza e verdade. E eu preciso fazer isto sem medos, culpas, pressões ou opressões. A minha fé precisa ser a do Evangelho de Jesus.

Eu preciso dar a mim mesmo o direito de ser crente em Jesus e continuar a ser gente neste mundo, porque foi isto que Jesus viveu e ensinou com a Sua vida. Não significa liberdade para fazer o que eu penso, sinto ou acho que é certo, mas a liberdade de andar guiado pelo Espírito Santo. A lei do Espírito de vida em Cristo Jesus nos libertou da lei do pecado e da morte.

Eu não preciso ter todas as respostas e nem ter uma vida perfeita para me compadecer do meu semelhante e ser solidário com ele. Eu não preciso fingir que não tenho problemas e conflitos ou que não sinto medo e tristeza. Eu posso ser verdadeiramente humano e ainda assim ser alguém que caminha com Deus.

É aí que não existe verdadeira espiritualidade sem genuína humanidade e não existe genuína humanidade sem uma sadia espiritualidade.

Pense que Jesus quer que sejamos gente que é capaz de socorrer o seu semelhante, simplesmente, porque ele é seu semelhante. Gente que pode amar a Deus e as pessoas com simplicidade. Gente que pode se compadecer de quem sofre, sem julgar e sem colocar rótulos ou começar a usar jargões religiosos e oferecer fórmulas, receitas e soluções pré-fabricadas que só desrespeitam a dor e o sofrimento das pessoas.

Precisamos resgatar, urgentemente, a espontaneidade da nossa fé e a humanidade da nossa espiritualidade. Aprender a viver um Evangelho que tenha o jeito de Jesus e não o dos religiosos que falam em Seu nome, mas que não expressam a Sua graça, a Sua simplicidade, a Sua humildade e nem o Seu amor. Expressar uma fé que seja uma combinação sadia de honestidade e esperança.

Que Deus nos ajude, por Sua graça, a viver uma espiritualidade como a de Jesus, o Deus que se fez gente.

Paulo Cardoso

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